15 de nov. de 2012

ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA.

José Saramago.

O homem, levado pelo tempo, pelo tempo veloz, não tem mais “tempo” para apreciar o “tempo”. O consumismo entrou em nossas casas, sentou-se a nossa mesa e comeu da nossa comida. A estandartização do homem, o processo de igualização e a perda do significado das coisas ofertam a roupagem da crise de identidade que atravessamos.

José Saramago, em Ensaio sobre a Cegueira, na magnitude de quem arrebatou merecidamente o Prêmio Nobel e põe-se dentre os maiores escritores de todos os tempos, mescla literatura e sabedoria para dizer que precisamos parar, debruçar-nos sobre a vida e, paradoxalmente, fechar os olhos para ver. Como diz o Livro dos Conselhos: “Se podes olhar, vê. Se podes ver, repara”.

A obra do português é a proposta de antítese à modernidade. O filme de Fernando Meirelles, que recebe a designação do livro homônimo, não é só inspirado na obra do escritor e dramaturgo, mas registra a franca e difícil pretensão de reproduzir a história que brotou da mente e das mãos de Saramago. Como afirma o próprio autor, num dos diálogos que intenta a busca da causa da cegueira: “Porque foi que cegamos? Não sei, talvez um dia se cheque a conhecer a razão. Queres que te diga o que penso? Diz. Penso que não cegamos, penso que estamos cegos. Cegos que vêem. Cegos, que, vendo, não vêem”.

O que nos leva a cegar? As mensagens subliminares do consumismo, a imposição do pertencimento e a institucionalização do agir faz com que as pessoas não se percebam mais e não percebam os outros. A velocidade da vida amordaça o homem e impõe o questionamento da idéia de liberdade. A patologia que acomete os personagens de Saramago não é biológica. A institucionalização da cegueira registra relação direta com a formatação do homem moderno, vítima de um processo de padronização perversa que sepulta as individualidades, responsáveis pela composição do mosaico social, do qual a pluralidade é condição fundante.

A velocidade em gigahertz da modernidade, a necessidade de respostas imediatas, a instantaneidade do tempo, no que Zygmunt Bauman chamou de modernidade líquida, encobriu a vida, engoliu a vida, matou a vida (...) sobrou, a cegueira. Saramago propõe a reflexão do homem e o início de um caminho que resgate a lucidez perdida, o afeto vilipendiado e a passividade contemplativa. Ao mesmo tempo em que promove o tempo ao posto de contêiner de capacidade infinita, a modernidade fluída dissolve – erige uma névoa e desvaloriza sua duração.

A busca do significado das coisas e a reparação do que foi abandonado, mutilado, do que já deixou de se tornar caro ao homem, é uma das missões que Saramago propõe.

Num dia trivial, defronte ao sinal de trânsito, um carro apresenta-se imóvel dentre o movimento intenso: um homem acusa estar cego, sem motivo aparente. Inicia-se o contágio do que vem a ser denominado “treva branca”. O número de pessoas contaminadas pela morbidade aumenta cada vez mais e o Estado determina a quarentena de todos, impondo um isolamento autoritário e mórbido, sem qualquer contato com o mundo externo.

Dentre os cegos, uma mulher ainda mantém a visão biológica (Já que o ato de enxergar, para Saramago, tem outras conotações, numa riqueza metafórica impressionante). Guia então os demais reclusos até que um grupo decide impor um regime tirano e grotesco, manipulando a comida enviada pelo governo e exigindo em troca bens e serviços sexuais das mulheres. O grupo subordinado revolta-se e consegue restabelecer as forças, quando “alcança a liberdade”, deparando-se com um mundo destruído onde o caos impera e a cegueira vitimou a todos.


O “reencontro” do homem consigo mesmo, representado na retomada do afeto, do respeito mútuo e da lucidez daqueles que deixam a reclusão, impõe a dura mensagem de Saramago, que lança mão da metáfora da cegueira para permitir que todos enxergassem novamente. Enxergar o quê? A vida, os outros e, em última instância, a nós mesmos.



Jeferson Dytz Marin 

2 de nov. de 2012

TIREM OS BURACOS DO CAMINHO QUE EU QUERO PASSAR!



Um dos Buracos da RS 470.


Já é voz corrente no Estado a grita proveniente da situação das nossas rodovias. Até a serra gaúcha, que sempre registrou uma tradição de boas estradas, está sendo vitimada pelo caráter deplorável de praticamente todas as vias da região.

Outras rincões do Rio Grande, como a metade sul, que já enfrentam realidades lastimáveis a algum tempo, hoje, registram alguns trechos nos quais é praticamente impossível distinguir os buracos de eventual pavimentação regular. Enfim, a estrada encontra-se em completo estado de inacessibilidade. Por sinal, em recente viagem que realizamos a Santa Maria, constatamos que o trecho entre a aludida cidade universitária e Paraíso do Sul é, seguramente, um dos piores que já trafegamos. Só a hospitalidade cediça do povo santa-mariense e os predicados intelectuais oferecidos pela cidade, em face do celeiro de talentos que registra, compensam o calvário. De qualquer sorte, rever os antigos amigos tem exigido muito daqueles que visitam Santa Maria.

A RST-470, que liga Bento Gonçalves a Veranópolis, registra trechos calamitosos, que põe em sério risco os motoristas que trafegam pelo trecho. O caminho até a capital do Basalto não oferece melhor sorte, já que se apresenta igualmente repleto de buracos.

Nem os trechos pedagiados escapam. São comuns os remendos que desnivelam o asfalto e também oferecem risco aos motoristas. Assim, o que deveria ser exemplo de qualidade e segurança acaba revertendo em novos prejuízos aos usuários. Por sinal, na semana passada, em programa de rádio do qual participamos em Bento Gonçalves, dois proprietários de transportadoras informavam que já ingressaram com mais de uma dezena de ações contra o Estado e as concessionárias, em face de prejuízos causados aos caminhões por conta do estado das rodovias pedagiadas. Assim, paga-se para trafegar e paga-se para consertar os veículos.

Espera-se que esta realidade seja modificada imediatamente, sob pena de ultrajar ainda mais a matriz produtiva, as empresas, os agricultores e todos os usuários das rodovias. Contudo, até que a situação calamitosa permaneça inalterada, vale lembrar que os usuários têm reconhecido o direito a buscar a reparação pelos prejuízos oriundos dos acidentes provocados pelas más condições das rodovias. Assim, aquele que experimentar qualquer dano em seu veículo, poderá ingressar com ação indenizatória contra o Estado do Rio Grande do Sul, na hipótese de rodovia estadual, contra a União, na hipótese de rodovia federal e, também, poderá incluir a concessionária quando se tratar de rodovia pedagiada. O ideal é que o motorista providencie laudo mecânico dando conta dos prejuízos e  fotografias do sinistro, provando o ocorrido.

Certamente todos clamam por uma solução ingente! No momento em que nos voltamos para a Lei Seca, responsável sim pela considerável diminuição do número de acidentes, as rodovias permanecem em completo abandono, redundando em riscos ainda maiores aos motoristas, receosos das condições funestas que as estradas do Rio Grande do Sul apresentam.

Jeferson Dytz Marin