23 de fev. de 2014

A LEI E SUA (IN)JUSTIÇA.

 
 
As realidades, constantes no nosso conviver, desviam a atenção de determinados acontecimentos paradigmas. Estamos enraizados a uma perspectiva que se torna difícil enxergar por sobre o pequeno muro frente ao qual se está. E, ainda, há os que não tem por pretensão desanuviar essa bruma que nos envolve. Não é um caso comum o pensar. Mas isso não é escusa, temos que agir; que seja até pelo pensamento.
É o caso no âmbito jurídico também, estamos habituados a interpretar uma norma em lei positivada e por vezes esquecemo-nos de aplicar, tanto sobre a interpretação como sobre a possível revogação do dispositivo legal, as noções morais que não mudam e se mantém, quando corretas. Não que se queira levar para um sentido deontológico extremo, mas tomando um exemplo e mantendo-o até o fim, sabemos que a escravidão dos negros, prática tão difundida até o final do século XIX no nosso país, estava regulamentada e permitida tanto pelo costume e pelo cânone religioso como pela lei.
Com efeito, se uma lei pode estipular uma prática tão agressiva quanto absurdamente ridícula, que confiança podemos depositar nas normas que retiramos de seus dispositivos, quando sabemos que o sistema é falho e o positivismo não é uma verdade absoluta?
Independente de a lei daquele século, editada de forma legitimada, corresponder às necessidades do Brasil, seja por costumes ou apelos da economia, nada disso faz com que se esqueça de constantes morais universais, leis que ultrapassam o positivismo para agir sobre um plano superior, de ideias que planam sobre a ética e a moral. Assim mesmo determinou Rousseau (2013, p. 27) quando afirmou que “nenhum homem tem uma autoridade natural sobre seu semelhante e (...) a força não produz nenhum direito”.
Seria uma grande mentira negarmos que há conceitos que quando verificados em conformidade levam a conclusão que um ser humano, independente de sua cor, jamais possa ser uma propriedade, isso porque ele é dotado da mesma humanidade da qual o próprio analisador se encontra, excluindo-se sua história particular.
Assim, se uma lei pode cometer uma grande injustiça, que seja a menor de todas as injustiças (que sempre no curso do atual positivismo haverão de existir), independentemente de corresponder ao tempo para o qual ela é formulada. Porque, embora o passar de épocas, a escravidão sempre foi uma prática e, excedendo os costumes, evidencia-se que dela nada se extrai de justo.
Ademais, sabendo-se que são as leis um sistema falho para resolver os conflitos de uma sociedade, resta saber quando haverá o livramento do condicionamento extremo à uma fonte formal que dificilmente solucionará o Direito em maior completude. Afinal, não haveriam de ainda existir escravos?
 
Augusto Antônio Fontanive Leal

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