4 de out. de 2012

Quem Inventou a Tristeza, Trate de Desinventar...

Prof. Ovídio Baptista da Silva.


Alguns passam pelo mundo para viver no anonimato. Outros para acumular riqueza. Outros para sobreviver. Alguns amam. Outros odeiam. Alguns passam a vida inteira buscando a felicidade... e não encontram. Alguns têm certeza do que não querem. Outros têm certeza do que querem. A maioria vive a vida de todos: trabalho, casa, família, domingos, feriados... Outros não têm família.

Poucos, contudo, fazem história. O doutor Ovídio Baptista da Silva foi um desses. Fez da sua vida, do conjunto de seus dias, de sua obra e dele próprio, um marco perene.

Os olhos embotados de lágrimas e livros, vítimas do efeito nefasto do fim. O coração apertado e seguindo a passos largos e lentos. As palavras ausentes. A fala pouca. A voz que me resta. O corpo dormente. O estancar do sangue. O sangue das palavras. As palavras empapuçadas de dor, de mágoa, de ausência, do fardo da falta. Da fuga da letra. Da presença da ausência. Da tristeza imanente à partida.

ÚNICO

Estamos todos órfãos. Órfãos de nosso mestre. Nosso baluarte. Nosso norte. Nosso exemplo. O depositário das verdades autênticas. Das verdades verdadeiras, satíricas, corajosas e profundas.

O professor Ovídio era desses sujeitos que se vê uma vez e não se esquece. Forte. Presente. De pensamento tenaz e personalidade segura, ingente, altiva. Seus alunos carregarão consigo a eterna satisfação da convivência, a herança da notória sabedoria, a áurea que cercava o grande homem e a firmeza aguda e com destino certo de cada uma de suas convicções. E convicção é certeza adquirida por demonstração. É persuasão íntima. Ovídio Baptista tinha convicção vernacular, corpulenta, convicção convicta. Demonstrou-a com clareza quando concebeu a tutela antecipada, consolidada no dispositivo 273 do Código de Processo Civil. Quando criticava a sociedade mercantilista, que sufocava a igualdade, porque na sua gênese, optou por uma liberdade perniciosa, excludente, seletiva, cruel.

Aqueles que com ele conviveram não lembrarão apenas da figura do grande processualista, seguramente um dos maiores que o Brasil produziu. Ao lado de Pontes de Miranda, Barbosa Moreira, Galeno Lacerda. Não. Lembrarão precipuamente do professor Ovídio como um homem forte, singular, contundente. Um homem de opinião genuína. Algo raro no direito moderno. A salvo da influência daqueles que moldam os pareceristas do centro do país, do jugo dos colegas de cátedra e do enquadramento social. Ovídio era um bravo. Era errante, enorme, infinito.

A MORTE DO HOMEM. O NASCIMENTO DO MITO

Ovídio sempre será o que foi. O que é dentro de cada um que o leu. Que com ele conviveu e aprendeu. Para mim, mais do que um perito das letras jurídicas, é um mito, um vulto inspirador, um farol. Será eterno! Será reproduzido e lembrado por seus alunos e pelos alunos de seus alunos. Estará presente em Jaqueline Mielke Silva, em Jania Saldanha e em tantos outros que o seguiram. Se é pecado institucionalizado falar de poesia sem lembrar de Mário Quintana, também será um vilipêndio lembrar de tutelas de urgência, de cautelares, sem pronunciar o nome do são-borjense Ovídio Baptista da Silva.

Com a morte do homem, nasce o mito. O espírito de Ovídio continuará presente no pó sedento das bibliotecas, na fumaça cálida das conversas de bar, nas idéias que brotam famintas nas salas de pesquisa, no direito que desperta todos os dias no átrio dos fóruns, nas primeiras lições de processo dos estudantes, na caliça que se debruça às costas dos operadores, na vida que continua e que como o crepúsculo matutino insiste em ser vida, mesmo com a falta do mestre, do amigo, da lição desperta, do pão jurídico de cada dia.

Jeferson Dytz Marin

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