Justiça Divergente. |
HÁ JUSTIÇA EM UMA DECISÃO JUDICIAL?
Vivemos a chamada era do relativismo, das incertezas, das verdades mutantes e do fim de valores absolutos. E a constatação é positiva ou negativa? Parece que a resposta pode ser num ou noutro sentido,dependendo do ângulo que é observada. Contudo, a verdade é que a incerteza se traduz num sintoma da modernidade e temos que nos acostumar a conviver com ela.
Como afirmou o
próprio Marx, há muito, a mordernidade faz com que “tudo que seja sólido desmanche no ar”. Atualmente, o sociológo
polonês Zygmunt Bauman, um best seller, autor de livros como “Modernidade e
Holocausto”, “A arte da vida”, “Amor líquido”, “Tempos líquidos” e
“Identidade”, deu asas a ideia do economista barbudo que combatia o
capitalismo, concebendo o que denominou de “modernidade líquida”. O tempo da
incerteza, da insegurança, dos conceitos que se dissipam, se dissolvem no ar.
Das verdades relativas, da crise de valores. Da ausência de rumo.
Rubem Alves asseverou que, “Quem não tem jardins por dentro e não planta
jardins por fora, não passeia por eles”. Sim, são os jardineiros que tendem
a ser os mais zelosos e hábeis dos seres humanos, os guardiões das utopias. É
na imagem do ideal pré-concebida pelos jardineiros – verdadeiros cuidadores –
que nos alimentamos para tentar manter vivas as utopias numa sociedade que as
fere de morte a cada dia que se vai.
DECISÃO JUDICIAL, INSATISFAÇÃO E VERDADE RELATIVA
O direito também
é vítima do fim das utopias. E a discussão da justiça de uma decisão judicial,
passa, necessariamente, pela concepção idealística. Mas afinal, uma decisão
proferida por um juiz, um terceiro que aprecia o argumento de duas partes,
representadas no processo por seus advogados, produz justiça? O que é justiça?
É possível conceber um conceito de justiça que seja capaz de abarcar uma
decisão equanime, ideal, a salvo de qualquer contestação?
Seguramente, as
pessoas que buscam o Poder Judiciário se perguntam, sempre, acerca da
pertinência ou não da decisão. Da justiça que ela produz no caso concreto! E não
há dúvida. É absolutamente minoritário o número de cidadãos que busca o
Judiciário sob o pálio da má-fé, da tentativa de ludibriar o juízo ou convictos
de que o argumento empregado não é razoável. As pessoas acionam o Estado,
através do Judiciário, já que, no mais das vezes, têm convicção de que aquilo
que afirmam está calcado na ideia de justiça, a partir de um senso comum básico.
Um mínimo existencial do direito. O que processualmente se denomina de
“condição da ação”.
Mas o certo é que
as decisões judiciais são relativas e produzem justiça, apenas, para a parte
vencedora. A ideia de “conforto”, de “acolhida” do Poder Judiciário, que dá uma
“resposta” ao cidadão que o busca, não parece encontrar correspondência no caso
concreto. A parte derrotada fica insatisfeita e, portanto, não percebe a
decisão como “justa”.
A SENTENÇA COMO ESCOLHA DE UMA DAS VERSÕES
Pode-se dizer,
então, que as decisões judiciais não produzem justiça concreta para ambas as
partes, embora no plano processual, a sentença seja aceita como válida. As
decisões, na verdade, elegem uma das versões postas por autor ou réu como sendo
a mais adequada, a mais fundamentada e aquela que condiz com os mandamentos
legais e jurisprudenciais. Além, é claro, da influência inevitável da formação
e do posicionamento do julgador, que, a partir da percepção forjada nas provas
produzidas no processo, decidirá.
A justiça existe.
Mas no plano das utopias. É bom que exista, que seja combustível para a
equidade, para um julgamento correto. As utopias são absolutamente necessárias.
Sem elas, não há sonho. Devemos acreditar nas utupoias. Contudo, no plano
objetivo, temos que reconhecer, com certo pesar, que a decisão judicial “opta”
pelos argumentos de uma das partes, gerando satisfação ao vencedor e angústia
ao derrotado. Ou seja, a justiça paira sobre aquele que convence o juízo e
vence a ação, desamparando o outro, que não logrou êxito em sua tarefa. E de
quem é a razão? Ambos a têm. Contudo, apenas um conquista seu reconhecimento.
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